31/12/2010 08h00 - Atualizado em 31/12/2010 08h00
Léo Rabello: 'Futebol é uma mentira. O que o jogador vê é dinheiro'
Dono da carteira nº1 de agente no país, empresário vê falsidade no amor à camisa e admite que às vezes tira proveito do amadorismo dos dirigentes
Léo Rabelo não cogita aposentadoria: 'Vivo em paz.'
(Foto: Luciano Ribeiro / GLOBOESPORTE.COM)
Com apenas 29 jogadores sob seu comando, nenhum deles no topo da cadeia internacional, Léo Rabello pode não parecer um empresário influente para as novas gerações. Mas foi ele o primeiro brasileiro a enxergar potencial no mercado de transferências. Rubro-negro desde a infância, chegou a dirigente do clube nos anos 70. Naquela década, nascia a geração que transformaria o clube em um gigante de conquistas. Surgia também um estalo para Rabello. Ali ele percebeu que a falta de tato dos jogadores para negociações era uma mina de ouro. Trocou o amadorismo dos cargos de diretoria pelos cifrões que enxergou de longe.(Foto: Luciano Ribeiro / GLOBOESPORTE.COM)
Atualmente, o dono da carteirinha 001 de agente Fifa no Brasil não tem o futebol como número um em sua lista de prazeres. Empresário há 25 anos, Léo Rabello é exemplo clássico do velho ditado sobre consumo de salsichas. Se quem as produz é incapaz de comê-las, o mesmo vale para quem conhece a fundo os ingredientes dos boleiros. Rabello não vai a um estádio desde 2008. Só torce pelo seu Flamengo pela TV, e mesmo assim com bem menos ímpeto dos que nos velhos tempos. Atualmente, na maior parte das vezes um jogo é só um jogo. Ou melhor, só mais uma oportunidade de negócio.
- Estou no futebol desde 66. Isso frequentando o Flamengo. Como dirigente, desde 77. Ninguém é filho de chocadeira, sou Flamengo, era fanático. Hoje há um desgaste grande. Praticamente não vou a jogo. O último foi a final da Libertadores do Fluminense contra a LDU. Quando quero um jogador, mando os nossos auxiliares verem. Às vezes, acho meio enfadonho. O futebol que o público vê é uma grande mentira. O jogador de futebol vê dinheiro. Esse carinho, esse amor não existe, é folclórico. Quem balança a camisa quando faz gol, beija escudo, é hipócrita. Raros pensam diferente – resumiu o agente, que tem como principais ações neste fim de ano a permanência de Joel Santana no Botafogo, a transferência de Madson para o Atlético-PR e a tentativa de retorno de Thiago Neves do Al Hilal para o futebol brasileiro (Fluminense e Flamengo são os interessados).
Joel ri à toa com o prestigio no Botafogo. Técnico tem auxílio de Rabello em negociações (Foto: Ag. Estado)
A tese de que futebol é uma fraude bem disfarçada confirma o autorretrato de Rabello, que se define acima de qualquer coisa como um “autêntico”. A língua sem travas não acerta só os jogadores. O empresário também se incomoda com a classe dos dirigentes. Ele culpa a legislação e diz não entender como um cartola pode ser responsável por orçamentos milionários sem ser cobrado profissionalmente por isso. De peito aberto, admite que às vezes tira proveito dos erros de planejamento das diretorias. Quando os resultados não acontecem, é hora daquele telefonema básico oferecendo reforço.Era preciso fazer os dirigentes tratarem o clube como se fosse sua casa"
Léo Rabello
Muitos desgastes
Rabello ataca os craques que tentaram carreira na gestão do Flamengo, mas a recíproca é a mesma. Em 2004, Júnior teve problemas com o empresário logo no início da sua caminhada como dirigente. Com boas relações na diretoria, o agente tentou colocar na Gávea o desconhecido atacante argentino Castillo. Fechou tudo com a ala amadora no clube, mas Júnior brecou. Atualmente, ninguém lembra mais de Castillo. Mas também é verdade que não são boas as lembranças de Rafael Gaúcho, Negreiros, Welliton, Diogo, Flávio e Dill, alguns dos atacantes que vestiram a camisa rubro-negra naquela temporada.
Quem balança a camisa quando faz gol, beija escudo, é hipócrita"
Léo Rabello
Se o afeto pelo vermelho e preto não é mais o de antigamente, a relação profissional com o clube continua estreita. Seis nomes da base do Flamengo têm contrato com Rabello: o goleiro Caio, os zagueiros Fernando e Escobar, os meias Vitor Saba e Ygor, e o atacante Vitor Hugo. Entre os profissionais, há o volante Rômulo. O Fluminense aparece como segundo colocado na lista de atuações, com três jogadores, sem contar o interesse em Thiago Neves. No clube, há quem diga que o zagueiro Thiago Sales, também do casting de Rabello, só foi para as Laranjeiras em julho porque estava no “pacote” para o empresário lutar pela liberação de Neves. O goleiro juvenil Silezio e o volante Leandro Dantas são outros vinculados a Fluminense e Rabello.
O agente aposta na base, mas diz que, se fosse dirigente de clube, jamais permitiria a presença de empresários nos treinos das promessas. Em sua visão, é aonde os aproveitadores mais têm êxito.
Isso que você lê no jornal, o glamour, isso não existe. Mais de 90% dos jogadores vivem na maior miséria"
Léo Rabello
Nesta época do ano, os telefonemas aumentam na proporção dos anúncios de panetone e jingles melosos.
- Tocam umas 30, 18 furadas. É imprensa, conversa fiada, jogador ligando para pedir ajuda. A estrela não liga, mas os outros ficam preocupadíssimos quando estão sem contrato. Nós temos uma responsabilidade grande. Isso que você lê no jornal, o glamour, isso não existe. Mais de 90% dos jogadores, que deve ser algo perto de 20 mil federados, vivem na maior miséria. Só 3 ou 4 % têm esses salários altos. Não passa disso. Futebol é uma profissão muito efêmera. O cara trabalha 10 anos em média. O salário alto dilui no tempo. Raros são aqueles que têm formação para exercer uma profissão. É treinador, preparador físico, auxiliar, fora isso não tem mais nada para fazer. Porque eles não estudam nada, não sabem nada. E precisam de alguém estruturado por trás para render bem.